Estatística Descritiva x Inferencial nas Avaliações segundo a NBR 14653-1:2019

A discussão sobre o papel da estatística nas avaliações imobiliárias exige rigor conceitual e, sobretudo, aderência estrita ao que determina a NBR 14653-1:2019 – Avaliação de Bens – Parte 1 – Procedimentos Gerais.
A norma não utiliza explicitamente as expressões “estatística descritiva” ou “estatística inferencial”, porém descreve procedimentos técnicos cujo conteúdo corresponde, de forma inequívoca, à estatística descritiva, ao passo que a utilização de modelos inferenciais permanece facultativa.
A seguir, a fundamentação normativa precisa.
1. Existe a obrigatoriedade da Estatística Descritiva na NBR 14653-1:2019?
A estatística descritiva está implícita nos requisitos normativos referentes à coleta, organização, tratamento e análise da amostra de mercado, presentes nos seguintes itens:
6.3 – Identificação do bem e das variáveis significativas
A norma exige que o avaliador identifique, classifique e analise as variáveis relevantes do bem e do mercado.
A descrição, qualificação e categorização das variáveis constituem a base da análise descritiva.
6.4 – Pesquisa de mercado/coleta de dados
O item impõe a necessidade de:
- obtenção sistemática de dados,
- registro,
- tabulação,
- organização dos elementos coletados.
Essas operações correspondem diretamente ao escopo da estatística descritiva, que fornece o suporte técnico para transformar dados brutos em informação organizada e analisável.
6.7 – Tratamento dos dados
A norma determina que os dados coletados devem ser tratados conforme a metodologia adotada.
O tratamento mínimo – independentemente do modelo – consiste justamente na análise descritiva que envolve:
- medidas de tendência central,
- medidas de dispersão,
- identificação de valores discrepantes,
- síntese estatística da amostra.
O texto normativo deixa claro que o avaliador deve obrigatoriamente realizar esse tratamento inicial para garantir consistência e coerência dos dados.
2. O Método Comparativo Direto e o papel da amostra – Item 7.2.1
Na versão 2019, o Método Comparativo Direto aparece como item 7.2.1.
O texto normativo estabelece que o avaliador deve:
- estruturar uma amostra representativa;
- realizar tratamento adequado dos dados;
- analisar a coerência interna dos elementos pesquisados;
- extrair indicadores consistentes e justificáveis.
Esses procedimentos constituem integralmente o arcabouço da estatística descritiva.
Um trecho importante da norma afirma:
“podem levar à coleta de amostras que não atendam na íntegra aos pressupostos formais das amostras […] exigidos pelos modelos de estatística inferencial”.
Essa afirmação possui duas consequências técnicas:
- A norma reconhece que as amostras de mercado imobiliário frequentemente não atendem às premissas formais exigidas pela estatística inferencial (como normalidade, independência, homocedasticidade etc.).
- Portanto, não é obrigatório aplicar modelos estatísticos inferenciais (como regressão).
3. Inferência Estatística: facultatividade normativa
A inferência estatística — regressão ou modelagem matemática — surge na norma apenas como possibilidade metodológica, não como exigência.
A liberdade técnica conferida ao avaliador permite:
- adotar modelos matemáticos quando adequados;
- fundamentar os parâmetros utilizados;
- demonstrar a consistência da modelagem, se empregada.
Mas a norma não exige modelagem como requisito mínimo. O método mínimo normativo é plenamente atendido com estatística descritiva mas é opção do perito decidir qual o método mais adequado para seu laudo ou parecer.
A norma:
- reconhece as limitações das amostras imobiliárias para atender aos pressupostos da inferência;
- não impõe modelagem estatística;
- não vincula o resultado da avaliação à construção de modelos matemáticos.
Assim, a relevância normativa e prática recai primordialmente sobre a Estatística Descritiva, que é a técnica indispensável para conformidade com a norma e adequada interpretação da amostra de mercado.
Conclusão Técnica e Normativa
Com base na NBR 14653-1:2019, conclui-se que a estatística descritiva é indispensável para garantir a conformidade normativa e a adequada interpretação da amostra de mercado. A inferência estatística, embora não obrigatória, pode ser utilizada para fortalecer a fundamentação técnica e conferir maior credibilidade ao laudo, desde que respeitados os princípios da norma: representatividade, rastreabilidade, coerência e fundamentação.”
Diante disso, surge a questão: na sua prática avaliativa, você privilegiaria a estatística descritiva como base mínima obrigatória ou buscaria complementar com a inferência estatística para ampliar a robustez dos resultados?
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*** Esta publicação tem como objetivo fomentar o diálogo crítico entre profissionais da área de avaliações, incentivando reflexões divergentes, complementares ou analíticas — desde que fundamentadas em argumentos técnicos, teóricos ou normativos. Ao promover esse espaço de troca qualificada, busca-se fortalecer a cultura avaliativa e ampliar a compreensão sobre os procedimentos estabelecidos pela NBR 14653-1:2019.
Autor: Fernando de Queiroz
Professor, advogado & Perito Avaliador
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Coautor pesquisador: Cesar Moura
Gestor de negócios imobiliários e perito avaliador
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